XAQUÍN MARÍN E A ÉTICA / IDEOLOGIA DOS HUMORES
OSVALDO MACEDO DE SOUSA(Universidad de Lisboa)

Title:
Xaquín Marín and the ethics / ideology of the humours
Resumen / Abstract:
Este artigo aprofunda no universo ético de Xaquín Marín, a desconstruir os seus temas, mensagens, símbolos e arquetipos principais, que no seu conjunto espelham as constelações das suas ideologias humorísticas. Conclue-se que no humor do cartunista galego sim há uma ética ou ideologia especial: a de ser ele próprio, rebelde, assertivo, desperto para o que o rodeia e transformar tudo iso em filosofia, em humor para que nós possamos deglutir de uma forma mais suave e digestiva. / This article delves into the ethical universe of Xaquín Marín, deconstructing his main themes, messages, symbols and archetypes, which reflect the constellations of his humorous ideologies. It is concluded that in the humour of the Galician cartoonist there is a special ethics or ideology: being himself, rebel, assertive, awake to what surrounds him and transforming all that into philosophy, humour so that we can swallow it in a smoother and more digestive way
Palabras clave / Keywords:
Xaquín Marín, Humor gráfico gallego, ideología, simbolismos, Ética/ Xaquín Marín, Galician Satiric Cartoons, ideology, simbology, Ethics
Notas:
Este documento tiene una versión en español en este mismo número.

XAQUÍN MARÍN E A ÉTICA / IDEOLOGIA DOS HUMORES


«Este é un mundo de tolos, pasamos a vida

loitando para salvalo de nós mesmos»

Isolino

Falar do desenho do Xaquín Marín é um contrassenso já que os seus desenhos, muitos deles sem texto, já dizem tudo, não necessitando portanto, que os outros especulem sobre o que eles querem ou não dizer. Quando a encomenda do texto é feito pela pessoa que mais estudou e conhece a obra e artista, a situação torna-se ainda mais caricata mas, como admiro os dois, vou tentar dar o meu melhor e não desfraldar as espectativas.

O tema que me foi distribuído é o seu universo ético, ou seja desconstruir os seus principais temas, mensagens, símbolos e arquétipos que no seu conjunto espelham as constelações das suas ideologias humorísticas. Falo no plural porque em Xaquín Marín tudo é simples no seu olhar de cronista, de testemunha de uma sociedade viva e retorcida, sendo consequentemente complexa, porque dentro desse universo existem múltiplas galáxias, múltiplas estrelas, supernovas e buracos negros… que é a realidade sobre a qual o seu olhar arguto sempre esteve atento e nos revela pelas deformações, performances humorísticas. Falar dos desenhos de Xaquín Marín é falar do tempo, da evolução da sociedade, suas queixas e alertas, da história revelada em traços irreverentes razão pela qual falar das éticas, das ideologias que trespassam o seu trabalho é como ir ao psicanalista de toda uma população, numa viagem quântica e transversal ás várias dimensões do quotidiano. Perante esta gigantesca análise pergunto-me como conseguir resumir em palavras esse espirito de um mestre da retranca, trasacordo, sorna e rexouba galegas? Como falar de alguém que é mais Castelaoano que Quevediano, mais Quixotesco que Goyesco continuando contudo telúrico e humorístico em que o sorriso filosófico está muito mais presente que a gargalhada Rabelaiana?

               
    O arquétipo do cacique (chapéu, óculos de sol, fato, gravata) tem ficado invariável durante cinco décadas. © 1976 Xaquín Marín         O capataz com chicote, um arquétipo do poder com o que, como com o pé, Marín sublinha nomeadamente la docilidade das vítimas. © 1976 Xaquín Marín    

Todos sabemos que tanto o sorriso, como a gargalhada do baixo-ventre, são próprias da criança, dos jovens da sociedade que olha de frente o futuro e que não se perde nos dramas do passado. O humorista é o adulto que preserva essa visão de irreverencia adolescente, amadurecido na forja da vida e do pensamento filosófico humorístico. Apesar de se dizer que na comicidade se perde a ingenuidade, despontando o lado maquiavélesco do Homem, mais a malicia do ser, na boa verdade se com o humor se perde umas características, ganham qualidades como aprender a “enxergar” a vida, fazer um esforço reflexivo. Mesmo que a dor, a tragédia invada a alma, abrem-se as entranhas da realidade com o sorriso da esperança num mundo melhor.

Se há ideologias orientadoras dos humoristas, é esta, porque como disse o brasileiro Angeli[1],

... o meu trabalho serve para tirar o sarro desse insetozinho mal resolvido, chamado Homem, seja ele da situação ou de oposição. Ridículo não tem ideologia e quando tenta ter, fica muito mais ridículo. /…/ Acho que o humorista que começa a trabalhar para uma ideologia faz propaganda e não humor. Perde o poder de fogo. Ele precisa ser um franco-atirador (Angeli, 1985: 41).

Esta posição secunda a intenção que já em 1879 o português Raphael Bordallo Pinheiro defendia, no editorial do seu jornal António Maria[2], ou seja, ser oposição aos governos e oposição às oposições. Esta a essência e a situação, por vezes e, naturalmente, mal compreendida de Xaquín Marín.

Antón Cortizas, para o álbum “Trinta e Tantos com Xaquín Marín” de 2001 escreveu:

Xaquín, un home que debuxa dende dentro, pero que sabe à perfeccion que non existe un dentro se non hai un fora. O fora de Xaquín é este país que, para bem e para mal, resultou ser coma un paxaro que o criou a poder de lle por bicadas de luz no peito do seu niño de persoa. /…/ Sabe encher o mundo, mesmo aquel que non dá moito para sorrir, mesmo aquel que reborda sufrimento, cos trazos curvilíneos da bondade do humor (Cortizas, 2001: 6-7).  

Na realidade a ideologia de Xaquín é o coração, uma alma profunda sentida e sorridente que impôs a tristeza do ADN galego para chorar o mundo no sorriso aberto e descarado em que os grotescos graníticos mais não sejam que milagres peregrinos da fé no ser humano. A sua estética humorística é um murro nas tendências das modas e modismos, numa originalidade crua e bela em que a força telúrica da paisagem galega se reflecte em traços angulosos ou doces consoante os temas e momentos onde o pensamento transmuta-se na ideologia ácida da comicidade e a poética do humorismo resultando na ética da irreverencia cúmplice e sorridente.

                       
    A emigración, um tema omnipresente em Marín até o início dos anos 80 que voltou com força nos últimos tempos. No quadrinho central representa-se a discriminação da língua galega. No quadrinho da direita vemos os cavaleiros, dos que o conselho de administração de El Ideal Gallego não gostou nada. Todas as imagens são © 1977 Xaquín Marín    

Xaquín Marín é um menestrel que sob o som estridente da gaita de foles da retranca nos atira á cara, não à alma, a realidade crua da vida. Dizer verdades com um sorriso é uma filosofia difícil que só os eleitos conseguem com o seu espirito de filósofos optimistas e crentes na humanidade.

Não nos podemos esquecer que antes de tudo, Xaquín Marín é um pintor que derivou a sua comunicação plástica para a estética de imprensa na irreverência intervencionista. Éra um pintor que tinha dentro de si uma visão demasiado literária para se restringir. O que não deixou totalmente de fazer, telas de beleza estética, sendo por isso levado a desenvolver linhas de diálogo mais activas com a sociedade. Em vez de um pintor autista que só fala para a sua alma, é um pintor cronista que fala pela e com a sociedade, expressando não só o que lhe vai na alma, mas como na alma dos companheiros do dia-a-dia, na alma da aldeia, da cidade, do planeta. Como ele próprio proclama, não é sua função limitar-se a observar, tem de “marchar no medio da xente, cos seus problemas e preocupacions (Lorenzo Ruibal, 2014).

Nesta frase concentra-se a ética humorística de Xaquín Marín, marchar entre o povo, apalpar a sua alma, sentir os seus pesares, suas preocupações, seus sonhos e dessa perspectiva retratar a realidade, não de uma forma trágica, porque para isso já basta o espirito galego, o quotidiano, mas irreverentemente pois o “humor salva-nos do desespero” (Loureiro, 2005: 12).

             
    “Mâquina adorada”: a denúncia dos excessos da tecnologia. © 1989 Xaquín Marín.       Reis Mágicos. Uma subtil denúncia do racismo. © 1992 Xaquín Marín.    

O humor pode não destituir regimes, governos, políticos, não consegue capitanear multidões em direcção à revolução mas sim para a evolução, ajudando os Homens a verem a realidade, mudando-lhe a perspectiva do mundo e, se ele muda, pode mudar a atitude do individuo, do grupo e empurrar o mundo para uma mudança.

Na imprensa gráfica há duas vias para isso se concretizar, o dito “cartoon editorial”, o desenho que navega na crista da onda, visando o momento específico, o que tem como consequência perder rapidamente a actualidade, ficando esquecida na efemeridade da notícia (necessitando muita das vezes no futuro um texto de contextualização) e o desenho mais filosófico. Sem ser de humor branco, é mais intemporal. Apesar de ser sobre a actualidade, busca mais fundo as razões, os problemas, a visão é mais perene pela qualidade de intervenção e, por infelicidade social, serem temas que não se resolvem rapidamente, perdurando nos meses, nos anos, décadas… Xaquín fez “cartoon editorial”, alguns com caricaturas de políticos mas, as intervenções intemporais serão as dominantes e que marcam a sua obra. Não é um caricaturista político? Claro que tudo é política e mesmo a sátira social é desenho politico, ou se preferirem, um humor politizado. Dessa forma ele é um artista sempre actual, cujos desenhos podem ser republicados constantemente. Ao preferir esta linha editorial (menos apelativas para a imprensa consumista e sensacionalista), torna o seu trabalho profundamente ideológico, mas não numa visão de ética partidária já que Xaquín concorda profundamente com o editorial de Raphael Bordallo Pinheiro, ou seja o humorista é quem está sempre em oposição mesmo às oposições.

O traço do nosso artista é uma arma de irreverencia, um escalpelo que disseca a vida num olhar poético, porque sorridente, e irónico, porque denunciador. Quem gosta de estereótipos, de etiquetar as pessoas dirão que ele é um homem de esquerda porque preocupado com o povo, com a exploração, a corrupção, os abusos do poder, com o ambiente… eu diria que ele é apenas um humanista, um pensador que no alto das fragas graníticas da Galiza analisa a vida com um sorriso cupido de cumplicidade e de retranca. Sim, ele é profundamente galego e a sua ética caricatural está embrenhada nesse ADN frio, húmido, pungente, trágico e consequentemente irónico.

             
    A contaminação cultural, um dos temas favoritos de Marín. © 1980 Xaquín Marín.       O consumismo disparatado e a destrução do ambiente. © 1989 Xaquín Marín.    

Como tal, os seus heróis são dominantemente os galegos. Apesar de encontrarmos diversos anti-heróis com nome próprio, ele não necessitou criar um “Zé Povinho”[3], como fizeram os portugueses, bastando-lhe usar a boina galega e polos a falar a língua. Eles serão uma presença constante e duradoira o que não impediu de criar alguns anti-heróis. Para facilitar a comunicação, a maior parte dos artistas criou meia dúzia de tipos de anti-heróis, ou seja “as crianças rebeldes”, “a família”, “o vagabundo”, “os zoomorfismos”, “personagens regionais” e outros[4]. Xaquín usará vários outros mas a criança terá uma presença forte já que logo no inicio, em 1974 encontramos o “Gaspariño”, seguido em 1976 pelo “Caetano”, em 1980 pelo “Lixandro” e em 1998 “Tonecho”… concentrando nestas personagens as suas preocupações com a sobrevivência, os problemas da emigração, o despovoamento da terra e o choque entre o campo e a cidade. Nesta sua visão, por vezes sarcástica, por vezes com algum humor negro, encontramos um “velho do restelo” (personagem dos Lusíadas de Luís de Camões que está contra a partida das naus na busca de novos mundos) que luta contra a modernização, a evolução do território ou uma consciência que alerta para os caminhos que a evolução deve seguir, mas não dessa forma? Alertar é ir contra ou é para que as pessoas pensem antes de embarcar nas alterações para depois não se lamentarem? Como já referimos, o principal papel do humor é fazer para, fazer pensar e só depois sorrir ou rir. Se não compreenderam, se não sorriram e interiorizaram, o artista volta a apresentar a mesma questão doutra forma, tentando em cada reviravolta da criatividade ir mais a fundo, ir mais ao âmago das questões para espicaçar o sorriso do despertar da mente para ver com outros olhos a realidade.

             
    As “Letras Galegas”, símbolo da fragilidade de uma língua que cobra protagonismo uma vez por ano. © 1989 Xaquín Marín.       O patrão a admoestar, outro arquetipo do poder ejercido abusivamente. © 1991 Xaquín Marín.    

A denúncia social é constante e repetitiva, já que é um poço sem fundo, como por vezes ele retrata a própria Galiza, terra de oportunidades explorada por caciques economicistas como D. Carcundio[5] (com o seu chapéu citadino, óculos de sol, bigodinho, fato e grava), D. Augusto[6] ou os celebres “Xinetes”[7] que nos fazem lembrar as albardas que Raphael Bordallo Pinheiro criou como símbolo da opressão, de impostos, sobre as costas do povo. Em Xaquín a albarda torna-se quase despercebida porque o cacique cavalga mesmo nas costas do galego. A par destes anti-herois irónicos haverá outras representações dos Patrões, Capatazes…

Um ícone ainda mais explícito desse poder opressivo foi uma das primeiras bandeiras do nosso humorista: O Pés[8]. Esmagado sob o peso do pé anónimo, são centenas as variações que o nosso artista realizou como denuncia do peso do quotidiano, numa dimensão em que as vitimas não tinham qualquer hipótese de derrubar o pé e libertar-se, quanto muito esgueirar-se um pouco ou pensar “o mellor é faxer como se non o viramos”, porque se alguém ainda pensa – “¡Temos que tomar medidas contra o pé!” outro mais submisso responderá “E se facemos unha tuna?”. Dos resignados não conta a história e se até houve no início algumas reservas por parte dos editores para com estas paródias, aqui demonstra o caminho que Xaquín Marín queria percorrer no futuro, a anti-resignação em sátira.

Se a denúncia da opressão, do poder plenipotenciário e vigilante começou pela base, os pés, posteriormente ele desenvolverá outra iconografia do mesmo âmbito, mas agora no pedestal, ou seja “As Estátuas”[9], um jogo de alegorias monumentais com o fino sorriso da ironia atenta ao dia-a-dia.

             
    O buraco com a forma do mapa da Galiza, uma inteligente maneira de evocar a depressão do país. © 1998 Xaquín Marín.       O desarraigamento da urbanização, outra das preocupações recorrentes do autor.© 1999 Xaquín Marín. © 1999 Xaquín Marín.    

Esse dia a dia que o rodeia é naturalmente galego, porque é ai que vive e naturalmente as cenografias dos seus trabalhos reflectem a terra que o rodeia, com os seus Cruzeiros, misto de marco religioso e caciquico, com o granito das igrejas, das casas, dos muros e que por vezes se transformam em traços com que retrata o povo galego. Povo sempre presente, moldando a sua ética, o seu ideário humorístico e o seu traço estético onde se confrontam o campo e a cidade, a tradição e a evolução do cimento que vai devorando a terra. Neste confronto de mundos alguns símbolos vão-se impor na obra de Xaquín, como as chaminés poluidoras, a máscara anti-gás, os tsunamis de lixo, os excessos de tecnologia… Não cai no tópico dos falsos cosmopolitismos, porque sabe que só se pode ser universal desde as próprias raízes e se combate pelo ambiente contra o falso progresso é porque como ambientalista sabe que é mais importante uma cultura da prevenção que a exploração pelo lucro imediato e destrutivo.

Naturalmente denota-se um especial compromisso com a cultura galega, onde as classes desfavorecidas ganham voz pela sua pena, um microcosmos que no fundo é o reflexo de um macrocosmos do planeta.

Devido ao uso a abuso de toda a iconografia galega poderemos cair na tentação de etiquetar Xaquín Marín como um humorista etnográfico? Isto parece uma piada que nem faz sorrir. O artista apenas usa os elementos identificadores que melhor facilitem o seu trabalho e se eles são etnográficos e atingem os objectivos, melhor.

                     
        A descomposição da família. © 2000 Xaquín Marín.         O éxodo africano a Europa. A inmigração vista por Marín. © 2003 Xaquín Marín.      

Se haverá muito trabalhos em que Xaquín não necessita de palavras, já que o pensamento aliado aos traços tudo dizem, ou tudo sugerem, como galeguista combativo, a língua galega será também um dos seus cavalos de batalha, pelo uso e pela denúncia da sua saúde. A recuperação da Língua Galega foi uma conquista da transição e da democracia mas num percurso bastante atribulado e aguerrido em que Xaquín participou e continua a participar. Uma das características do seu trabalho é pois o uso do galego mas de uma forma telúrica como se fosse esculpido no granito, o que proporciona uma das característica estéticas dos seus trabalhos, essa letras que tanto custa impor como linguajar oficial. Naturalmente, como tudo o que é oficial para entreter o povo, há um Dia da Lingua Galega[10], onde há muitos discursos e promessas, para tudo se esquecer no dia seguinte, contudo Xaquín está atento e todos os anos o comemora com uma nova sátira, com uma nova ironia e em que as letras ganham mais vida, nomeadamente o G de Galiza e o X que é o som característico da galiza e que não existe no castelhano. I como a linguagem gráfica vive de símbolos iconográficos, a própria língua torna-se autóctone da boca e transforma-se em personagem satírica.

Falei no inicio que é típico dos humoristas recorrerem a zoomorfismos para criação de personagens e Xaquín Marín não foge à regra onde o “Sapoconcho” (que será nome da revista do Museu de Humor de Fene, mais uma das criações do nosso prolifero artista) tem um lugar especial e a “Curuxa” que será o símbolo dos Prémios distribuídos por aquele Museu[11].

Reduzir Xaquín Marín à Galiza é não se conhecer a dimensão desta obra, porque nada escapou ao seu olhar, à sua ironia. Sobre tudo ele desenhou, fez humor, tentou preencher essa cabeça oca, essa cabeça labiríntica que ele próprio iconografou na procura de a encher com humor e de a despertar para a realidade. Fala da família, da violência familiar, da exploração da mulher, do sexismo, racismo, da paz e da guerra (as pombas, os canhões…) porque se um humorista não é um moralista, um professor de ética, pelo menos, é uma pessoa desperta e atenta. Não interessa atacar o politico A, B ou C porque mudam os indivíduos, mantêm-se os problemas, por isso a sua ética humorística é denunciar os sistemas, a estrutura dos poderes, fazer humor intemporal e sempre actual.

       
    “Evolução”. A denúncia do machismo tem sido uma constante na obra de Marín. © 2004 Xaquín Marín.    

Deixo para final, uma das suas personagens, o idoso “Isolino”[12] co seu caxato, a sua gorra, as suas lentes. Será um alter-ego do artista que “canto menos futuro nos queda mais tempo adicamos a pensar nel”? É uma voz distanciada e descarnada de um idoso, que fala da velhice, do seu abandono pela sociedade, que perde peso no local de trabalho até ser despojado do seu espaço… Afastado da imprensa[13], ele continua a ser o eterno combatente porque “Cando o passado pesa mais que o futuro hai que vivir o presente”. Assim intensificou a sua presença nos meios sociais, em exposições, em festivais e salões porque ainda tem muita poesia para nos dar.

Há uma ética, uma ideologia especial no humor de Xaquín Marín? Sim, a de ser ele próprio, rebelde, assertivo, desperto para o que o rodeia e transformar tudo isso em filosofia, em humor para que nós possamos deglutir de uma forma mais suave e digestiva.

«Sigo sendo tan rebelde como cando era mozo,

 só que daquela non o desimulaba»

Isolino

Referências bibliográficas

ANGELI (1985): Chiclete com Banana, São Paulo, Circo Editorial Ltda, nº 1, Outubro de 1985.

CAMÕES, L. de,  Os Lusíadas, Canto IV, 94-97

CORTIZAS, A. (2001): “Limiar. Para quen leva agochado todo o mundo na mirada”, em Marín, X., Trinta e tantos con Xaquín Marín, Ferrol, Edição do autor, pp. 6-7.

LORENZO RUIBAL, U. (2014): “Xaquín Marín: ‘O cómic era o mellor vehículo para contar o que queriamos”, Noticieirogalego.com, 11 de febrero de 2014. Extraido o 18 de Febreiro de 2014 de http://www.noticieirogalego.com/Xaquín-Marín/

LOUREIRO, R. (2005): “Xaquín Marín: unha conversa con Ramón Loureiro”, em Marín, X., Xaquín Marín [50 anos en liña], Ferrol, Câmara Municipal de Ferrol, pp. 11-13.

 

NOTAS


[1] Arnaldo Angeli Filho (São Paulo1956), mais conhecido como Angeli, é um cartoonistas brasileiros mais importantes. Em 1973 foi contratado pelo diário Folha de São Paulo, onde colaborou até Maio de 2006. Em 1983 participou no lanzamento da revista Chiclete com Banana, que atingiu um grande sucesso editorial (pasou de atirar 20.000 ejemplares a 110.000) e onde colaboraram também outros grandesc cartoonistas brasileiros como Luiz Gê, Glauco, Roberto Paiva, Glauco Mattoso e Laerte Coutinho. É considerada como uma das publicações de banda desenhada para adultos mais importantes da história do Brasil. As tiras de Angeli foram publicadas em Alemanha, França, Itália, Espanha e Argentina, mas foi em Portugal onde atingiram mais relevância.

[2] Raphael Bordallo Pinheiro (Lisboa, 1846-1905), escrito também Rafael Bordalo Pinheiro, é considerado o pai do moderno humor gráfico português e um dos caricaturistas lusos mais importantes da história. Fundou quatro sobresaintes periódicos lisboetas: A Lanterna Mágica (1875), O António Maria (1879), Pontos nos ii (1885) e A Paródia (1900). A sua escola foi seguida pela maioria dos humoristas gráficos portugueses até bem entrada a segunda metade do século XX.

[3] Zé Povinho é o anti-herói por excelência do cartoon português. Foi creado por Raphael Bordallo Pinheiro no 12 de Junho de1875 em A Lanterna Mágica.

[4] Todas estas categorias estavam representadas na exposição colectiva sobre a história do humor no cómic universal que aconteceu em 2011 no XIII Festival Internacional de BD de Amadora, Portugal. A mostra fue comisariada por Osvaldo Macedo de Sousa e nela participou Xaquín Marín com o personagem de Caitano. Na exposição também foi representado outro galego, Gogue, com o personagem de Floreano, ao que desenha diariamente em Faro de Vigo desde 1989. Foram os únicos autores estrangeiros covidados.

[5] Antecedente de “D. Augusto”, protagonizou umas poucas tiras em La Codorniz em 1976.

[6] A série de “D. Augusto” (sempre tiras) foi publicada em A Nosa Terra de Setembro de 1979 a Dezembro de 1981.

[7] Ricos montados a cavalo sobre paisanos pobres. Protagonizaram muitos quadrinhos em El Ideal Gallego e outros jornais. Ainda hoje, Marín desenha-os esporadicamente.

[8] Do Pé publicaram-se dous livros recopilatórios: Cen pés (Ediciós do Castro, 1996) e Cen+cen pés (Embora, 2007).

[9] As Estátuas são outro dos símbolos do poder de Xaquín Marín, quem as começou a desenhar a princípios do século XXI. Trata-se de quadrinhos de estátuas sobre grandes pedestais em que o humor surge de la conjunção do elemento plástico com o texto da placa colocada no pedestal.

[10] O Día das Letras Galegas celebra-se ao 17 de maio desde 1963 para conmemorar um escritor galego morto há pelo menos dez anos. É feirado em toda a Comunidade Autónoma.

[11] Sapoconcho e curuxa são duas palavras galegas que en português significan tortuga e coruja, respectivamente. Xaquín Marín tem desenhado muitos animais nos seus quadrinhos. Incluso um deles foi protagonista de uma tira: “Palleiro” (um cão de rua), publicado entre 1999 e 2003 na revista de cómic infantil Golfiño.

[12] A série de “Isolino” publica-se em La Voz de Galicia desde Febreiro de 2006 e originou um libro recopilatório (O lecer de Isolino, Embora, 2008).

[13] Ao dizer “afastado da imprensa”, o autor deve de se referir a que desde que começou a série de “Isolino”, Marín foi deslocado à secção de “Pasatiempos” de La Voz de Galicia. Antes publicava nomeadamente em “Opinión”. Mas continua a colaborar todos os dias com o diário corunhês.

TEBEOAFINES
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Creación de la ficha (2017): Manuel Barrero · Imágenes proporcionadas por el autor del texto.
CITA DE ESTE DOCUMENTO / CITATION:
OSVALDO MACEDO DE SOUSA (2017): "Xaquín marín e a ética / ideologia dos humores", en Tebeosfera, tercera época, 4 (18-IX-2017). Asociación Cultural Tebeosfera, Sevilla. Disponible en línea el 22/XII/2024 en: https://www.tebeosfera.com/documentos/xaquin_marin_e_a_etica_ideologia_dos_humores.html